NEUTRALIDADE DA REDE:
Tribunal Federal de Apelações da 6ª Região nos EUA invalida regulamento da FCC que previa o princípio da neutralidade da rede.
(Vladimir Aras)
A Corte de Apelações do Sexto Circuito dos Estados Unidos, com sede em Cincinnati, derrubou as regras de neutralidade da rede estabelecidas pela Federal Communications Commission (FCC). Essas regras impediam os provedores de banda larga de bloquear conteúdos da Internet ou de reduzir a velocidade de acesso a eles.
A decisão do tribunal regional aplicou o precedente “Loper Bright”, estabelecido pela Suprema Corte dos EUA em junho de 2024, que restringiu o poder de agências reguladoras norte-americanas de tratarem de matérias em sua esfera de atuação sem autorização expressa do Congresso, por meio de lei federal. Essa interpretação foi adotada pela corte regional para sustentar que a FCC não teria competência (“statutory authority”) para implementar tais regras.
Estava em questão o regulamento baixado pela FCC com base na Lei de Comunicações de 1934, alterada pela Lei de Telecomunicações de 1996, e especialmente a natureza jurídica dos provedores de Internet (Broadband Internet Service Providers): se serviços de telecomunicação ou se, apenas, serviços de informação.
Ao longo de diversos governos federais, a interpretação da FCC mudou, com diversas idas e vindas sobre a natureza de tais serviços, sem que houvesse alteração legislativa. Com uma concepção “pós-Loper Bright”, o Tribunal em Ohio resolveu pôr fim ao que chamou de “vacilações” da FCC na matéria.
O princípio da neutralidade da rede busca proteger os consumidores contra práticas discriminatórias de provedores, como a priorização paga de certos conteúdos.
Veja: youtu.be/9CFlYDEs4Ww
A decisão da corte em Ohio representa uma vitória para empresas de telecomunicações, que veem a regulamentação como excesso de intervenção estatal na governança da Internet. Contudo, o pronunciamento do tribunal não impede que o Congresso dos EUA legisle sobre a matéria. Também não suprime leis estaduais que tenham o mesmo objetivo.
No Brasil, a neutralidade da Internet é um princípio básico do ciberespaço, previsto no artigo 3º, inciso IV, do Marco Civil da Internet (MCI), desde 2014.
Sua disciplina vem especificamente no artigo 9º do MCI, determinando que os provedores de conexão e de aplicações tratem de forma isonômica os dados que trafegam na internet, sem discriminação, restrição ou priorização com base em sua origem, destino, conteúdo, serviço, terminal ou aplicação utilizada.
Assim, os provedores de conexão à internet não podem favorecer ou prejudicar certos conteúdos, serviços, aplicações ou dispositivos, garantindo que todos os dados sejam tratados da mesma forma. Este quadro cria ao mesmo tempo um direito consumerista e um direto digital.
Algumas exceções à regra de neutralidade são previstas no art. 9º, §1º, que permitem discriminação ou degradação de tráfego em duas hipóteses relacionadas aos requisitos técnicos indispensáveis à prestação do serviço adequado; e à priorização de serviços de emergência, quando necessário.
A supervisão e regulamentação desse princípio são realizadas pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL).
O principal objetivo do princípio da neutralidade é garantir uma internet aberta e democrática, promovendo a liberdade de expressão, a inovação e o acesso igualitário à informação; e proteger o usuário contra discriminações econômicas, políticas ou sociais no uso da rede, resultantes de abuso de poder tecnológico.
Deste modo, podemos concluir que a neutralidade da internet é um pilar essencial para assegurar que a Internet funcione como um espaço livre e acessível a todos, sem interferências indevidas por parte dos intermediários da infraestrutura digital.