«Chefe de mocambo, "general das armas" do quilombo, parece certo que o Zumbi participou de todos os combates nos Palmares, desde antes de 1675, quando ficou aleijado em consequência de ferimento na perna, durante a entrada de Manuel Lopes. Depois de negociada a paz com o governador Pedro de Almeida, os negros mataram o rei Ganga-Zumba. Zumbi, que se negara a depor armas, assumiu a chefia do quilombo - e desde então iniciou-se uma nova fase na luta. Os negros contra-atacaram os homens de Fernão Carrilho (1686) e derrotaram os paulistas de Domingos Jorge Velho (1692) e, quando paulistas, alagoanos e pernambucanos se reuniram para destroçar o mocambo do Macaco, encontraram os negros tão bem fortificados que os sitiantes nem mesmo podiam tentar o reconhecimento das suas posições, sem que os seus homens fossem "pescados" pelos palmarinos. O sítio prolongou-se por 22 dias. Os atacantes estavam construindo uma contra-cerca em torno da dos negros e o Mestre de Campo dos paulistas lançava uma cerca oblíqua sobre o reduto, quando o Zumbi, pressentindo o perigo, ordenou a retirada geral, por uma brecha na contra.-cerca que margeava um precipício. Por esse ponto passaram, na calada da noite, cerca de mil combatentes palmarinos, sem que as sentinelas os notassem senão "no fim da sua retaguarda". Travou-se então o combate e, como estava escuro, e se lutava à beira do abismo, 200 negros rolaram pelo despenhadeiro e outros tantos perderam a vida, sob as cargas dos pernambucanos de Bernardo Vieira de Melo.
O Zumbi, nessa retirada, revelou-se um chefe consciente dos seus deveres. Foi um dos últimos a abandonar o reduto do Macaco, tanto que, nos combates, levou duas pelouradas das sentinelas. Certamente, porém, encontrou o caminho da fuga.
Este episódio do despenhadeiro, colorido pela fantasia de Sebastião da Rocha Pita, deu origem à lenda do suicídio do Zumbi. É possível, porém, que esta fosse a impressão geral, no momento. O governador Caetano de Melo e Castro, dando notícia ao rei da tomada da capital palmarina, escrevia que, entre os mortos, "entra um valoroso negro, que era seu general, e todos os mais cabos de nome...'
Na verdade, porém, o Zumbi não pereceu nesses combates, nem se atirou no abismo. Nos dias imediatos à captura do Macaco (6 de fevereiro de 1694), Domingos Jorge Velho passou atestados sobre a conduta militar de Bernardo Vieira de Melo e do capitão Antônio Pinto Pereira, pernambucanos, contando detalhadamente as peripécias do cerco, da luta e da perseguição aos negros, mas sem se referir, de maneira alguma, à morte do Zumbi. Somente em carta de 1696 o governador Caetano de Melo e Castro noticiava ao rei a morte do Zumbi, que, traído por um mulato, fora atacado no seu esconderijo por uma coluna de paulistas, sob o comando do capitão André Furtado de Mendonça. O Zumbi estava com mais 20 homens e resistiu bravamente, enfrentando os paulistas. Apenas um dos seus homens foi apanhado vivo. O Mestre de Campo dos paulistas confirmava a notícia, em requerimento ao rei, datando a morte do Zumbi de 20 de novembro de 1695, - quase dois anos depois de destruído o Macaco. No ano de 1697, André Furtado de Mendonça pedia e obtinha, no Reino, favores especiais, dando como um dos seus títulos a "valorosa ação" de matar o Zumbi.
Este é o Zumbi da História.
Não o que se atirou do rochedo, num grande gesto teatral, mas o que continuou vivo, reagrupando os seus homens, organizando novamente as forças de resistência do quilombo, - a mais prolongada tentativa de autogoverno dos povos negros no Brasil.»