Texto de Luís Pontes
Estávamos comentando,nesta coluna, sobre o Bohemian Grove, ou “Bosque Boêmio”, um acampamento anual de verão nos Estados Unidos que reúne muitos dos homens mais poderosos e ricos daquele país. E estes têm em comum – entre várias outras coisas – o fato de serem sócios do exclusivo e “secreto” Bohemian Club, uma agremiação de San Francisco, Califórnia, constituída só de homens, cujo santo padroeiro é São João Nepomuceno.
Para tentar ingressar no clube, é preciso ser convidado a se candidatar, e o processo de admissão costuma durar muito tempo, até cerca de 15 a 20 anos. Muito embora não existam regras claras para se ser aceito nessa agremiação, uma simples olhada no perfil de seus membros permite vislumbrar o que possivelmente mais conta para uma candidatura ser bem-sucedida. Geralmente, os sócios são brancos (preferencialmente de ascendência anglo-saxã), conservadores ou de “direita” (simpatizantes do partido Republicano norte-americano), protestantes, ricos, de elevado status social, bem-sucedidos em suas respectivas carreiras profissionais e com muitas conexões com pessoas e instituições poderosas.
Uma vez aceito no Bohemian Club, cada sócio paga uma taxa de admissão de nada menos que 25.000 dólares, ou cerca de 100.000 reais, além das anualidades, que tampouco devem ser baratas. Entretanto, tais contribuições pecuniárias não chegam a ser um grande problema para os sócios, os quais, em geral, têm seu status socioeconômico variando da alta classe média americana até o time dos milionários ou bilionários, para quem tais valores não passam de um “dinheiro de troco”…
Além de muita bebida e diversão, o acampamento do Bohemian Grove também oferece aos seus participantes alguns eventos mais sérios ou “edificantes”, como música, teatro e palestras. Estas últimas costumam abordar temas como política, história e economia, além de não raro serem proferidas por autoridades mundiais sobre esses assuntos.
Todos os anos, o acampamento recebe cerca de 2500 participantes. A maioria é de sócios do Bohemian Club, mas também são aceitos convidados, desde que aprovados por uma comissão. E assim, pela extensa área da sede campestre, com seus mais de 1000 hectares cobertos por florestas, são montados diversos acampamentos – mais de uma centena deles – com cada um tendo seu próprio nome e abrigando algumas dezenas de participantes do evento. Em geral, os diferentes acampamentos tendem a reunir pessoas com uma proximidade ainda maior de interesses. Por exemplo, o Owl´s Nest (Ninho da Coruja) é frequentado por presidentes americanos, oficiais das Forças Armadas e industriais militares. Já o Hill Billies é formado por industriais, políticos, reitores das mais renomadas universidades e grandes empresários da mídia.
Na primeira noite do Bohemian Grove, ocorre uma cerimônia solene e tradicional, assistida por todos os participantes, e chamada de “Cremation of Care” (A Cremação de Care). Trata-se de uma peça encenada no centro do clube, às margens de um lago artificial e diante de uma estátua de uma coruja (símbolo da agremiação) com cerca de dez metros de altura, que lá fica permanentemente. O roteiro dessa encenação é invariavelmente o mesmo: à luz de tochas, a cerimônia começa com algumas canoas deslizando pelo lago, conduzindo sinistras figuras encapuzadas de vermelho, as quais, por sua vez, levam como prisioneiro um demônio acorrentado chamado Dull Care (literalmente, em inglês, “Preocupação Tola”).
O demônio é então conduzido à presença de um Sumo Sacerdote (do clube) e profere uma série de ameaças e provocações aos membros daquela organização, no que é confrontado pelo seu interlocutor. Até que, no fim, o sacerdote toma a radical decisão de sacrificar o demônio, que é queimado vivo numa grande fogueira, soltando gritos lancinantes em meio a uma apoteose de fogos de artifício. E, nesse encerramento da cerimônia, o ator representando o demônio, sem que ninguém o perceba, é substituído por uma estátua humana, que arde em seu lugar.