"Não é porque as coisas são difíceis que não ousamos; é porque não ousamos que elas são difíceis." A reflexão de Sêneca, há dois milênios, já alertava sobre nossa tendência de buscar conforto na inação. Como a água, existimos em três estados: podemos ser frios como gelo, mornos como água estagnada ou quentes como a em ebulição. No universo dos concursos públicos, essa analogia revela muito sobre nossa jornada.
O gelo representa um estado de pausa consciente. Quando a água congela, preserva sua estrutura até chegar o momento certo de fluir novamente. É o concurseiro que reconhece a necessidade de parar um instante a fim de avaliar a trajetória até aqui. Talvez ele conclua que precisa mudar de método, reorganizar a rotina ou até repensar objetivos. Tudo bem, desde que estejamos falando de uma pausa tática.
A água morna, por sua vez, se deixada assim, parada, apodrece. Não tem a solidez do gelo nem a energia do vapor – apenas existe, estagnada, deteriorando-se lentamente. Assim é o concurseiro mediano: mantém uma rotina protocolar, um esforço comedido, uma dedicação preguiçosa. "Estudei duas horas hoje, já está bom", "não consegui fazer tantos exercícios, mas amanhã compenso", "isto aqui é difícil demais, vou pular" são as desculpas que, como alga em água parada, vão tornando o ambiente cada vez mais tóxico.
Até a Bíblia, em Apocalipse 3:16, adverte sobre esse estado: "Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca". A metáfora é visceral e precisa – a mornidão nos torna desprezíveis não só aos olhos divinos, mas também aos nossos. Como almejar a aprovação quando sequer nos entregamos por completo à preparação? Quando medimos cada passo para não nos comprometermos demais, acabamos nos comprometendo de menos.
Mas o maior perigo da água morna está em seu aconchego sedutor. Há imagem que evoque maior conforto e bem-estar que uma banheira de água tépida? Sem dúvida, é mais fácil flutuar na mediocridade que enfrentar o processo muitas vezes doloroso da ousadia. Não são poucos os que se iludem pensando que a segurança está em evitar extremos: não estudar demais "para não se sobrecarregar", não abdicar de certos prazeres "para manter a sanidade", não sonhar grande "para não criar expectativas irreais". Essa aparente prudência, contudo, está mais para veneno que mata lentamente qualquer projeto audacioso.
É, portanto, na ebulição que ocorre a verdadeira metamorfose. A água aquecida não apenas muda de forma; ela se expande, ocupa novos espaços, ganha potência. O concurseiro "quente" é aquele que enfrenta o edital como um guerreiro que, na batalha decisiva, analisa, planeja e é implacável no ataque. Cada página extra que ele lê, cada exercício que revisa, cada hora de sono que sacrifica é parte da jornada rumo à excelência. Como dizia Theodore Roosevelt, "se fracassar, ao menos que fracasse ousando grandes feitos, de modo que sua postura não seja nunca a dessas almas frias e tímidas que não conhecem nem a vitória nem a derrota."
Como se vê, cada estado da água tem lá suas características. No gelo, as moléculas estão reagrupadas enquanto aguardam o momento de voltar à ação. Na forma de vapor, resultado do calor e da agitação das moléculas, o líquido se expande e dá acesso a novos patamares. Na água parada – a menos desejável –, há podridão e contaminação. Quando se trata de preparação para concursos públicos, essas leis da física se traduzem em resultados bem concretos: o lento porém contínuo avançar do concurseiro que de tempos em tempos reavalia seus métodos, o sucesso do concurseiro que se entrega por inteiro ao projeto de mudar de vida, e as sucessivas reprovações do candidato medíocre.
Portanto, escolha seu estado com sabedoria. Se precisar congelar, diminuir o ritmo, que seja para preservar energia e planejar o recomeço. Se decidir esquentar, mantenha o fogo alto até alcançar a transformação completa. Mas nunca, jamais, se permita estagnar na mornidão. Porque água parada invariavelmente apodrece.